domingo, 13 de novembro de 2011

O dinossauro e os nossos filhos

Dia desses via um canal infantil e um programa mostrava algumas crianças numa máquina do tempo. Elas queriam saber como vivia o homem pré-histórico e, para tanto, viajaram ao passado transformando-se em homens da caverna, cabeludos, balbuciando “munga, munga...”.  De repente, um amedrontador tiranossauro, faminto, os perseguiu até conseguirem retornar ao presente – Ufa!

O mundo da fantasia é uma delícia. Tive saudade do tempo em que voltava do colégio e assistia “O Elo Perdido”. Lembrei-me até do quanto que ficava impressionado com aquelas animações rudimentares de dinossauro, e aquelas montagens toscas, além do enredo fantástico e absurdo.

Imerso nesses pensamentos, me deparei com uma questão que logo me arrebatou de volta a realidade: Qual o nível do conhecimento sobre os primórdios do homem, que as crianças atuais têm ? Deve ser bem melhor que o da minha época quando era preciso se deslocar até uma biblioteca para obter respostas.

Formulei, então, uma pergunta que deveria ser feita a crianças de 6 a 12 anos. Perguntaria se elas saberiam responder porque um dinossauro nunca conseguiu comer um ser humano.

Além de tentar enveredar pelo imaginário infantil, a pergunta teria também a motivação de verificar a situação do ensino básico neste mundão de meu Deus... Fiz algumas poucas perguntas, uma aqui outra ali...

O que era para ser uma brincadeira, na verdade foi uma surpresa: os pais, ao tentarem responder no lugar dos filhos, também desconheciam a resposta. Surpreenderam-me explicações do tipo “a carne dos humanos não agradava os dinossauros”.

Apesar da não representatividade estatística da enquete, passei a ficar convencido de que muitos adultos estariam enganados a respeito disso.

A pergunta, na verdade, não passa de uma pegadinha. A resposta é: um dinossauro nunca conseguiu se alimentar de um ser humano, simplesmente, porque dinossauros foram extintos milhões de anos antes do surgimento dos humanos! Na verdade, o próprio florescimento dos mamíferos, incluindo os primatas ancestrais, deu-se após o desaparecimento dos "dinos". 

De onde viria então esta informação de que dinossauros teriam vivido juntamente com os humanos primitivos ? A resposta é óbvia: a indústria voltada ao público infantil insiste naquela representação do homem das cavernas, ou fugindo de dinossauros, ou até os mantendo como animalzinho de estimação.

Na medida em que existe um padrão nesta situação, creio, não terá sido mero apelo comercial... Talvez os produtores, roteirista e ilustradores, não saibam responder a mesma simples pergunta da enquete. Afinal, vai saber se, assim como nós, pais, que assistíamos Fred Flinstone e líamos a tiras do Brucutu, ou da Turma do Piteco, também os produtores e roteiristas dos programas atuais não ficaram com aquela informação de que estas duas espécies teriam habitado o mesmo espaço-tempo na história geológica do planeta!?

A coisa não para por aí... Outros mitos, neste caso envolvendo animais da nossa atualidade, também são fixados no imaginário infantil, e parecem se perpetuar na idade adulta. Trata-se de outro padrão observado nos desenhos animados, quadrinhos e programas infantis: o bombardeio de imagens de algumas poucas espécies animais, via de regra, africanas, subliminarmente informando a sua onipresença no globo.

Novamente, nossos pequenos curiosos acabam ficando com a informação de que os animais que habitariam, por exemplo, uma floresta amazônica, seriam leões, chimpanzés, hipopótamos, elefantes e girafas. 

Existe até um desenho animado de produção e arte inteiramente nacionais, ambientado numa floresta, onde um dos personagens principais é um chimpanzé. Embora o desenho não mencione em que região do globo estaria aquela floresta, ele mistura, sem qualquer tipo de explicação, ursos e cangurus, hienas e jaguatiricas, girafas e antas. Alguma dúvida de que animais também andam de avião ?

Bom, de maneira alguma defendo uma frieza tecnicista a limitar o mundo da fantasia. Como falei, era maravilhoso aquele absurdo fantástico de “O Elo Perdido”. Mas há que se identificar quando a massificação da fantasia passa a criar mitos e quando prejudica um efetivo entendimento do mundo em que vivemos.  

Kemel Kalif