domingo, 6 de dezembro de 2015

Grana, fama e você

Outro dia, fuçando pelo youtube, mergulhei no rock nacional dos anos 1980s...

Os 80 são frequentemente associados a uma profunda recessão econômica mas, por outro lado, também nos lembram do punk rock "made in Bazil" da melhor qualidade! 

De fato, não há motivação melhor para reviver os 80 senão através da música.

Os 80 não receberam um título romântico como outras décadas o tiveram. Ao contrário, receberam a alcunha de "década perdida" e de completa estagnação econômica... 

Mas, ainda assim, lembro que vivíamos um novo Brasil... 

Sim, é verdade que os 80 foram tempos de hiper inflação, mas também de liberdade para reclamar. Finalmente podíamos falar, sem sermos presos, o que nossos pais não podiam ter dito na década anterior. A década perdida deu munição, então, para a ascensão de tudo que não era "bussines as usual", como do rock de protesto e de propostas políticas que antes só podiam ser discutidas na clandestinidade.

Um dos paradoxos dos 80 é que o engajamento e o desejo de lutar contra as agruras governamentais parece que se tornou, apenas, uma "esperança passiva", ou desesperança ativa. Se antes o sonho dos jovens era construir um mundo melhor, durante os 80 passou a ser, tão somente, arrumar um emprego.

Bandas de rock nacionais nos deixavam atônitos, boquiabertos, especialmente com suas letras que traduziam precisamente nossos anseios. Hoje, revivendo os 80s, me sinto um velho rabugento: aquelas letras eram absolutamente superficiais, pobres, sem poesia... Mas a minha revisitação também me trouxe uma nova classificação sobre as bandas da época. Hoje coloco a banda Plebe Rude entre as principais, e ainda atuais, bandas de punk rock primogênitas da década perdida. Os caras eram (são) realmente bons! As letras tinham certa profundidade, não eram compostas apenas do óbvio como era a maior parte das letras oitentistas. 

Deixo, portanto, a música "Minha Renda", para dividir com vocês as alegrias e as angústias da década perdida... A alegria vem por ter feito parte dessa década sensacional, a tristeza vem por ver que absolutamente nada mudou no cenário político brasileiro. Escutem: Https:// www.youtube.com / watch ? v = ia582x0E17Y


quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Vale a valoração ambiental?



Alguns devem lembrar do petroleiro Exxon Valdez (da Esso) que encalhou na costa do Alasca lá no final da década de 80... Foram cerca de 20 milhões de litros de petróleo lançados ao mar... 

As leis da época tratavam, basicamente, apenas dos "prejuízos econômicos ". Significa que uma multa, mesmo que pesada, não considerava a morte de centenas de milhares de espécies nem as profundas alterações ambientais causadas pelo vazamento. Não consideravam pois, simplesmente, não havia como estimar o valor das perdas sofridas pelo meio ambiente. Foi neste contexto, o de cálculo de multas por desastres dessa envergadura, que surgiu o que hoje chamamos de "valoração ambiental". 

A valoração permitiu ao mundo começar a falar em "serviços ambientais" e hoje, passadas quase três décadas do vazamento do Exxon Valdez, existem métodos refinados de valoração e também existem mecanismos legais que refletem esses métodos nas multas. 

Pois bem, lá se vão três décadas e aqui, neste nosso Brasil, ocorre rompimento de barragens de rejeitos de empresas poderosíssimas, jogando lama carregada de metais pesados, matando pessoas e praticamente destruindo um rio... Portanto, o recado é que estão disponíveis todas as ferramentas, sejam métodos de valoração sejam legislações ambientais, para dar uma encarcada nas empresas responsáveis pelo rompimento da barragem. Isto posto, dou-lhes enfim a má notícia: aqui não faltam métodos nem leis, falta "tão" somente, governança.

terça-feira, 10 de março de 2015

Ciência, tecnologia e trevas


Deveria incomodar, mas já nem incomoda mais, o fato de um ministro não entender da pasta que comanda. Não incomoda, pois é praxe e já perdemos a paciência. Mas e quando, além de não entender patavinas do assunto, um ministro “joga contra” o que comanda? Se não nos incomoda o “muito trivial”, nos incomodemos então com o “menos trivial”.

O ministro da Ciência e Tecnologia é um desses casos. Em 2010, o então deputado federal Aldo Rebelo formulou toda sua argumentação para derrubar o Código Florestal em supostas armações internacionais, as quais financiariam ambientalistas no Brasil com um único propósito: atravancar o desenvolvimento do País com a “desculpa” da conservação da natureza. Um relatório de uma ONG americana intitulado “Farms Here, Forests There” (Fazendas aqui, Florestas lá), acabou sendo usado como a “prova” cabal de que um complô internacional armava-se para impedir a expansão do agronegócio brasileiro.

O referido relatório, da ONG Union of Concerned Scientists, trazia menções explícitas ao Brasil, argumentando que os EUA não teriam como competir com a imensa e barata produção de commodities brasileiras. Grande erro. A ideia do relatório era pressionar o Congresso americano a aprovar leis que viabilizassem mecanismos de pagamento pela manutenção de florestas “em pé” pelos americanos aos brasileiros. Mas é óbvio que o simples título – Fazendas aqui (nos EUA), floresta lá (no Brasil) – foi interpretado como uma manobra imperialista, uma verdadeira afronta ao nosso complexo de inferioridade.

O deputado viu também conspirações na ciência mundial e buscou, então, argumentos entre os chamados “climate change deniers” (“negadores das mudanças climáticas”, ao pé da letra) – uma linha minoritária na ciência que defende a não existência do aquecimento global. A estratégia foi usada para invalidar as inúmeras críticas a sua proposta de alteração do código florestal, dentre elas, o estímulo ao aumento do desmatamento na Amazônia e possíveis consequências nas condições climáticas regionais e nacionais.

Pois bem...

Agora em 2015 o ministro Aldo Rebelo continua procurando cabelo em ovo, desta vez para defender a Petrobrás. Não por menos, o ministro usou parte de sua fala na aula inaugural de um curso de engenharia em SP para apontar uma suposta conspiração internacional para derrubar a estatal brasileira. Em seu discurso, interesses externos estariam por trás de uma campanha para tornar a Petrobrás menos competitiva e, de quebra, privatizar o pré-sal!

Nisso tudo, o que realmente preocupa não é o trivial, seja o retrocesso no Código Florestal, seja a debacle da Petrobrás. Incomoda mesmo é o fato de que os rumos da ciência brasileira estejam nas mãos da uma xenofobia casual e oportunista! O que deverá ocorrer quando um cientista brasileiro renomado, que porventura tenha sua pesquisa financiada por países ricos, se posicionar contra o ministério ou o governo? Este será desmerecido? Será um eterno “representante de interesses externos”?

O fato é que interesses competitivos entre nações sempre existiram, e provavelmente existiram por muito mais tempo, mas a “ciência” é muito mais do que o reducionismo cartesiano do atual cenário político brasileiro.

Sim, o que é menos trivial agora pode ser um grande incômodo. Não é estranho imaginar nos próximos anos, propostas governistas para barrar o financiamento externo de pesquisas no Brasil. Não é estranho imaginar que surja uma pauta do tipo: apenas financiamento estatal para ciência brasileira...

Bom, parece que uma nova Idade das Trevas está por vir.


Kemel A. B. Kalif (Artigo publicado no Estadão Noite de 10/03/2015)