terça-feira, 20 de agosto de 2013

Se é legal tá tudo bem?

Ministro da Fazenda falou e reafirmou: governo não considera novas desonerações em tributos e contribuições federais.

O argumento é que as desonerações já realizadas não deixariam mais espaço para novas reduções e/ou isenções de impostos. Governo estaria no limite daquilo que poderia renunciar em termos de arrecadação fiscal.

O problema é que, com tal declaração, governo considera, tão somente, se o nível de arrecadação será suficiente para pagar as contas públicas, mas não considera reduzir tais contas. Significa dizer, ignoram aquilo que é o motivo histórico dos descontentamentos: necessidade de cortes nos elevados gastos públicos.

E quando se fala em corte de gastos, não é corte de investimento, não é piorar serviços básicos como saúde e educação, não é eliminar uma secretaria ou um órgão essencial... Trata-se de cortar gastos com a soberba política e, se não é considerada uma soberba, trata-se, então, de discutir qual a necessidade, por exemplo, do volume atualmente destinado como verba de gabinete para parlamentares.

Segundo levantamento da ONG Transparência Brasil, um senador, por exemplo, custa R$ 33,4 milhões por ano, e um deputado federal custa R$ 6,6 milhões.

Para senadores tem o subsídio mensal e, além do 13º, tem 14º e 15º, recebidos, respectivamente, no início e no final de cada sessão legislativa. Têm também direito a 11 profissionais (seis assessores e cinco secretários parlamentares); verba Indenizatória de R$ 15 mil (para uso em gastos nos estados, com aluguel, gasolina, alimentação); auxílio-moradia (R$ 3.800); cota postal (varia segundo o número de eleitores do estado- Um senador do estado mais populoso, SP, tem direito a usar até R$ 60 mil/mês.Também têm cota telefônica (R$ 500 mensais); passagens aéreas (valor mínimo é de R$ 4,3 mil e máximo de R$ 16 mil); combustível (25 litros por dia); gráfica (R$ 8.500 por ano)...

Já deputados federais têm subsídio mensal, 13º, 14º e 15º salários; verba de gabinete de R$ 60 mil; verba indenizatória (R$ 15 mil, obs: verba pode ser acumulada); auxílio-moradia (R$ 3 mil); cota postal e telefônica (R$ 4.2687,55 para deputados, e R$ 5.513,09 para líderes e vice-líderes da Câmara, presidentes e vice-presidentes de comissões permanentes da Casa); passagens aéreas (valor mínimo é de R$ 4,3 mil e máximo de R$ 16 mil); gráfica (R$ 6 mil)...

E olha que não estamos falando nem dos deputados estaduais e vereadores, o que varia em números de representantes e nos montantes a que têm "direito" de gastar.

Ora, para manter uma estrutura dessas, é provável mesmo que reduções no volume arrecadado aumente o déficit público, seja no governo federal, seja nos estaduais ou nos municipais. Mas não é isso o que tem que vir a tona!

O que tem que emergir dessa declaração está nas entrelinhas, ou seja, significa que o governo não está disposto a reduzir gastos. Ao contrário, governo corre e, aos tropeços, abre as torneiras da verba pública para atender as emendas parlamentares. Com isso, tenta garantir a desobstrução das pautas que lhe são de interesse, ameaçadas de travamento pela própria base aliada – Aliás, diga-se, uma base mui amiga, daquelas que se constrói de forma tão coesa quanto rejunte feito com cuspe.

Na verdade, quem deveria falar sobre “impossibilidade de novas desonerações” seria a Presidência da República, e procurar lidar com própria fragilidade, e de sua base, o que inviabiliza os mencionados cortes de gastos públicos. Também deveriam dar as caras a Presidência do Senado e da Câmara dos Deputados, e explicar porque não abrem mão das dezenas de assessores familiares, desqualificados e fantasmas. Por fim, são os 81 senadores, 513 deputados federais, alguns milhares de deputados estaduais e vereadores, e mais um zilhão de supostos assessores e secretários, que precisam saber que o antiético é, por vezes, pior que o ilícito.


E no final das contas, vejamos a grande esperteza incutida na declaração do Ministro da Fazenda. Em uma só frase passa mensagens para apaziguar os ânimos de dois grupos distintos: De um o lado, para os parlamentares, o recado é: "não se preocupem, suas regalias não serão cortadas". Do outro, para a população, a grande mágica foi a de transformar em benefício uma péssima notícia. Em outras palavras, na medida em que fala, “estamos atentos às reivindicações das ruas", na verdade, quer dizer, "cobraremos mais e mais impostos, pois não importa se é ético, importa que é legal".